Imposto é obstáculo à transição energética
09/07/24
O caminho para uma economia de baixo carbono é impossível sem a ampliação da eletrificação.
A mineração brasileira tem papel estratégico na transição energética do mundo e pode contribuir para que o país se torne seu protagonista. O caminho para uma economia de baixo carbono é impossível sem ampliar a eletrificação, seja por meio de baterias, aerogeradores ou placas solares. Tudo isso exige minerais críticos e estratégicos, como lítio, nióbio, terras-raras e cobre. O minério de ferro, de que nosso país é um dos maiores produtores mundiais, é estratégico para a descarbonização do planeta não apenas na produção dos equipamentos mencionados, mas também como insumo primordial para o aço verde, que será viável a partir do hidrogênio verde, usado como substituto do coque (um produto fóssil) no alto-forno siderúrgico.
O Congresso, porém, parece ignorar essas vantagens comparativas ao incluir na reforma tributária, aprovada no fim de 2023, a criação do Imposto Seletivo (IS). Esse “imposto do pecado” incidirá sobre produtos e serviços que fazem mal à saúde ou ao meio ambiente, como bebidas, cigarros ou refrigerantes. O legislador, porém, introduziu nesse dispositivo legal setores importantes para a economia do país, como mineração, petróleo e gás.
No caso da mineração, os impactos causados pela atividade são compensados no licenciamento ambiental. O setor paga também a Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM), prevista na Constituição de 1988, recolhida para uso futuro da União, estados e municípios em razão da atividade extrativista. A CFEM é recolhida mensalmente durante todo o ciclo de vida da operação. Em 2023, a arrecadação com ela alcançou R$ 6,7 bilhões, incluídos nos R$ 85,6 bilhões recolhidos em tributos e encargos pelo setor.
O imposto seletivo, portanto, vai na contramão das tendências globais de incentivar a pesquisa e a produção em maior escala dos minerais críticos. Não há fonte de energia limpa e renovável que não demande esses minerais em seu desenvolvimento e operação. Um grupo de trabalho na Câmara dos Deputados debate uma proposta de regulamentação da reforma tributária, e ainda há tempo de corrigir essa distorção, que poderá frear as pretensões do país de ser tornar protagonista da economia verde.
Segundo a Agência Internacional de Energia, até 2030, teremos U$S 1,2 trilhão de investimentos destinados à transição energética. Para o Brasil, isso significa também um passaporte para um futuro mais próspero em termos de empregos e tecnologias, levando à redução de desigualdades regionais e, consequentemente, promovendo a justiça social. Hoje o setor mineral brasileiro emprega quase 2,5 milhões de pessoas ao longo da cadeia produtiva e representa 4% do Produto Interno Bruto (PIB). A transição energética poderá gerar ainda mais oportunidades para os brasileiros.
Um estudo recente do Serviço Geológico do Brasil mostra que só de potássio temos potencial de reservas que chegam a quase 640 milhões de toneladas. O texto traz um panorama das reservas brasileiras de cobre, grafite, lítio, níquel, fosfato, urânio e terras-raras. O Brasil tem elevada vocação mineral, com províncias minerais espalhadas por todo o território, mas é preciso dar condições para que esse mercado se desenvolva com segurança jurídica e fiscal. Criar um ambiente de aberração tributária só afastará novos investimentos, levando o país a perder a oportunidade de ser protagonista da nova história escrita pela transição energética.
*Raul Jungmann é presidente do Instituto Brasileiro de Mineração.
Fonte: O Globo (https://oglobo.globo.com/opiniao/artigos/coluna/2024/07/imposto-e-obstaculo-a-transicao-energetica.ghtml)